Materiais para construção sustentável: critérios para o LEED V4
A escolha de materiais para construção sustentável é uma difícil tarefa. Para atingir este objetivo, geralmente ouvimos de diversas fontes que é correto utilização de materiais locais, madeira certificada, materiais facilmente renováveis como o bambu, além dos diversos materiais ditos sustentáveis que são apresentados diariamente no mercado.
No entanto o fator sustentável nesse quesito é tão amplo, que envolve tantas variáveis, que possuímos pouquíssima garantia de que muitos desses materiais realmente empregam os princípios ‘verdes’ que vendem.
Por exemplo, o bambu que chega ao consumidor levantando a bandeira da sustentabilidade pode empregar uma mão-de-obra quase escrava na manufatura ou mesmo utilizar uma técnica de extração prejudicial ao meio-ambiente.
Ou talvez aquela cadeira linda de papelão projetada por Frank Gehry, que apesar de possuir um valor histórico já conhecido, pode durar tão pouco que é preferível a aquisição de uma cadeira metálica que possua um ciclo de vida mais longo. Como medir de forma coerente e garantir os objetivos?
Por este motivo que a nova versão do sistema LEED, a V4, evoluiu drasticamente toda a categoria de Materiais e Recursos para a obtenção da certificação, criando um incentivo na utilização de materiais com certificações ambientais já existentes no mercado internacional.
Se na versão de 2009 a pontuação era obtida com a utilização de materiais regionais (provenientes de um raio de até 800km do local de obra), com conteúdo reciclável (pós ou pré-consumidor) ou facilmente renováveis (que são repostos pela natureza em no máximo 10 anos) – agora é necessário demonstrar uma prova mais convincente: a certificação de terceiros sobre seus ingredientes, demonstrar sua origem, a forma de extração e como ela é descartada no final do processo, conforme o cumprimento de diversas normas ISO .
A ideia não é acusar ou desmerecer os fornecedores, mas sim recompensar aqueles que vem realizando um bom trabalho em diversos níveis da cadeia produtiva. E diversas siglas importantes com 3 letrinhas surgem para aprendermos – como os EPDs, HPD, CSR, LCA, BODs, C2C – e nos acostumarmos, pois elas se tornarão cada vez mais comuns nos próximos anos.
O sistema de créditos apresenta 3 formas principais de apresentar materiais para construção para a obtenção de créditos, que serão apresentados de forma rápida:
1- DIVULGAÇÃO E OTIMIZAÇÃO DE PRODUTOS DA CONSTRUÇÃO- DECLARAÇÃO DE PRODUTOS AMBIENTAIS
A intenção é encorajar a seleção de produtos cujos fabricantes tenham prova de melhores ciclos de vida ambientais. Aqui entram as certificações ambientais como a ISO 14044, 14025, 14044, 15804 ou ISO 21930 e os EPDs ou programas aprovados pelo USGBC. Existem dois pontos que podem ser adquiridos:
Opção 1. Declaração de Produtos Ambientais (EPD):
Um EPD é um meio padronizado de comunicação dos impactos ambientais, assim como o potencial de aquecimento global e a utilização de recursos energéticos de um produto ou sistema.
Os materiais podem contar como 1/4, 1/2 ou produto inteiro para o crédito caso possuam avaliações distintas. A mais rigorosa, e naturalmente a que mais conta para crédito, são os EPDs de produto específico Tipo III- Produtos com certificação de terceiros, incluindo verificação externa em que o fabricante é explicitamente reconhecido como participante pelo operador do programa.
Opção 2. Otimização de Múltiplos Atributos
A proposta é utilizar produtos avaliados conforme abaixo:
· Potencial de aquecimento global (gases de efeito estufa);
· Esgotamento da camada de Ozônio;
· Acidificação de terra e fontes d’agua;
· Eutrofização;
· Formação do ozônio trofosfrico;
· Esgotamento de recursos de energia não renováveis.
2- OTIMIZAÇÃO E DIVULGAÇÃO DE PRODUTOS DA CONSTRUÇÃO- ORIGEM DE MATÉRIAS-PRIMAS
A intenção é encorajar a seleção de produtos verificados por serem extraídos e armazenados de maneira responsável. Existem dois pontos que podem ser adquiridos:
Opção 1. Relatório de Origem e Extração de Matérias-Primas
O conceito é utilizar produtos de fabricantes que tenham lançado um relatório público de seus fornecedores de matérias-primas que incluam a localização da extração desses materais, um compromisso de longo prazo para uso do solo ecologicamente responsável, um compromisso em reduzir impactos ambientais da extração e do processo de fabricação, e um compromisso de utilizar padrões aplicáveis ou programas voluntariamente que demonstrem um critério de origem responsável.
Logicamente o que mais conta para crédito são os Relatórios de Sustentabilidade Corporativos (CSR), pois são verificados por terceiros como os EPD`s. Entre os CRS aceitáveis estão:
– Global Reporting Initiative (GRI) Sustainability Report
– Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD)- Diretrizes para Empresas Multinacionais
– Pacto Global das Nações Unidas: Comunicação de Progresso
– ISO 26000: 2010 Guia de Responsabilidade Social
Opção 2. Liderança em Práticas de Extração
Utilizar produtos que atendam pelo menos um dos critérios responsáveis de extração:
– Responsabilidade extendida do produtor: produtos comprados de um produtor que participe em um programa de responsabilidade extendida do produtor ou é diretamente responsável por esta responsabilidade;
– Materiais bio-formados: Devem atender aos padrões do Sustainable Agriculture Network e serem legalmente extraídos. Exclua peles de animais;
– Produtos em madeira: Devem ser certificados pelo Forest Stewardship Council;
– Reuso de materiais: Incluem produtos recondicionados, recuperados ou reutilizados;
– Conteúdo reciclável: É a soma do pós-consumidor mais metade do pré-consumidor, com base no custo.
3- OTIMIZAÇÃO E DIVULGAÇÃO DE PRODUTOS DA CONSTRUÇÃO- INGREDIENTES DE MATERIAIS:
A intenção é de encorajar o uso de produtos em que os ingredientes químicos são inventariados utilizando uma metodologia aceitável e por selecionar produtos verificados que minimizam o uso e geração de substâncias prejudiciais.
Opção 1. Relatório de Ingredientes Materiais
Utilize produtos que demonstrem um inventário químico de produto de pelo menos 0,1% conforme os programas abaixo:
Um inventário publicamente disponível de todos os ingredientes identificados por nome e um Número de Registro Químico (CARSN);
– Materiais definidos como segredos industriais ou propriedade intelectual podem reter o nome e/ou CARSN mas devem declarar função, quantidade e uma referência Greenscreen;
– Declaração de Saúde de Produto (HPD): O produto final possui uma Declaração de Saúde do Produto publicada com declaração completa de riscos conhecidos de acordo com os padrões do Health Product Declaration.
– Cradle to Cradle: O produto final é certificado como Cradle to Cradle v2 nível básico ou nível Bronze.
Opção 2. Otimização de Ingredientes e Materiais
Utilize produtos que documentem a otimização dos ingredientes utilizados no projeto:
– Greenscreen v1.2 benchmark: Produtos que possuam um inventário completo dos ingredientes para 100ppm que não possuam riscos enquadrados em Benchmark 1.
– Certificação Cradle to Cradle: Produtos finais com certificação, que variam em Silver, Platinum e Gold.
– Alternativa Internacional de Submissão – REACH Optimization: Produtos finais e materiais que não possuam substâncias que estejam enquadradas no critério REACH de substâncias de grande preocupação.
Opção 3. Otimização da cadeia de produto do fabricante
Utilize produtos que se originem de fabricantes que participem em programas validados de segurança, saúde, dano ou risco com uma documentação mínima de pelo menos 99% (do peso) dos ingredientes utilizados para criar o produto ou material, originados de verificação independente por terceiros com no mínimo:
– Processos que comuniquem com transparência ingredientes químicos junto com a cadeira de fornecimento de acordo com os danos disponíveis, exposição e informações de uso;
– Processos que identifiquem, documentem e comuniquem informação de saúde, segurança ou características ambientais dos ingredientes químicos;
– Processos que implementem medidas para lidar com a saúde, segurança e e risco dos ingredientes químicos;
– Processos que otimizem a saúde, segurança e impactos ambientais no desenvolvimento e melhoria dos ingredientes químicos;
– Processos que comuniquem, recebam e avaliem a segurança dos ingredientes químicos junto com a cadeira de fornecedores;
– Informações de gerência (Stewardship) sobre os ingredientes químicos que estejam publicamente disponíveis junto com a cadeia de fornecedores.
– Para atendimento de crédito da maioria das pontuações citadas, produtos originados (extraídos, fabricados, comprados) em até 100 milhas (160km) do endereço do projeto constam como 200% do custo base. Obviamente outros programas futuros aprovados pelo USGBC também contarão para cálculo do crédito.
CONCLUSÕES:
E para os arquitetos que precisam conciliar um bom projeto de arquitetura, o processo como um todo, a satisfação do cliente e ainda encontrar materiais para construção sustentável que cumpram o intuito e que ainda caibam no bolso, como proceder?
Não é tarefa fácil, principalmente em se tratando de Brasil. Enquanto nos EUA existem listagens de fácil acesso a qualquer material desejado ou mesmo os próprios certificados EPD e Cradle to Cradle para aqueles que buscam a certificação LEED na nova versão, no Brasil existem iniciativas por enquanto muito dispersas ou sem a força de que precisam, muitas originadas de iniciativas particulares ou mesmo por blogs e sites de fabricantes.
Uma grande promessa pode vir do nosso próprio amigo Google com seu projeto Portico, lançado agorinha no início de 2015, que é um banco de dados que permite arquitetos e engenheiros uma consulta ampla e transparente de materiais considerados saudáveis para a construção, por enquanto restrito à obras dos escritórios do Google.
Os fabricantes podem também disponibilizar seu próprio material, obter o resultado e caso ele não seja o almejado pode sofrer melhorias para próximas avaliações.
Podemos considerar que a transparência dos materiais para construção sustentável ainda estão em uma etapa de infância, e precisam evoluir muito.
O próprio sistema LEED considera o sistema de crédito que mais enfrentou diversas mudanças durante o desenvolvimento dos créditos para a versão 4, e diversas formas de declarações ambientais podem ser desenvolvidas nos próximos anos.
Ou seja, se hoje a certificação na nova versão pode ser um caminho tortuoso, na medida em que os produtos forem sendo cadastrados e certificados, o futuro tende a ser muito facilitado e transparente na escolha de bons materiais para construção.
Conhece algum material nacional que possua EPDs, HPDs ou outras certificações ambientais? Contribua conosco!
Matéria enviada por Filipe Boni, arquiteto, LEED AP BD+C e sócio diretor do 2030 Studio
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